Jornalismo musical: a arte de perguntar


Já vi tanta distorção ou desperdício de tempo e espaço na maneira como muitos estão abordando suas entrevistas que até me espanto. Profissionais, estudantes ou amadores, as aberrações jornalísticas ocorrem em todos os níveis. O entrevistador é aquela pessoa que terá a deliciosa, porém exigente, missão de arrancar mais do que respostas. Terá de conseguir boas respostas. Só que isso tem se perdido das prioridades.

Não se trata de sair perguntando a esmo, de qualquer jeito. O trabalho vira moleza e perde qualquer credibilidade quando não há um propósito inteligente. É justamente esse o ponto que separa o competente do amador. Devemos nos preparar bastante. Ainda que conheçamos o entrevistado ou que sejamos limitados uma única pergunta, temos de vasculhar com o máximo de interesse o assunto. É esse interesse preliminar que possibilitará um resultado final interessante.

A própria lida traz ensinamentos valiosos. Flemming Rasmussen, renomado produtor e engenheiro de som dinamarquês, promoveu-me um choque de realidade exemplar. Na ocasião em que o procurei para tratar de um dos álbuns mais icônicos em que trabalhou, Ride the Lightning, do Metallica, levei um puxão de orelha daqueles. E até hoje dou extremo valor àquilo.

Assim que suas respostas chegaram a minha caixa de mensagens, notei que havia algo a mais. Era a seguinte mensagem: “Da próxima vez que fizer uma entrevista, tente não colocar palavras na boca das pessoas. Você mesmo respondeu várias de suas questões nas próprias perguntas. Mais objetividade, menos fã”.

Eu não era mais um iniciante, o que não me impediu de pisar na bola como profissional (nem me impedirá, já que estamos, todos, sujeitos a dar mancadas). A observação direta de Rasmussen alertou-me para um ponto: a atenção com o que nos envolvemos em nosso trabalho deve ser redobrada e constante. Definitivamente não há espaço para comodismo.

Talvez por eu carregar uma dose elevada de preciosismo no que faço me torne um chato em alguns momentos. Porém, o fato é que há um grande número de entrevistadores desleixados, preguiçosos, encantados demais, fãs e, por que não, incompetentes. Esse povo costuma produzir pautas ao estilo mais-do-mesmo, superficiais e nada instigantes. Ou seja, o nível de profissionalismo cai fundo no limbo. Nesse ponto, as facilidades da internet colaboram negativamente, abrindo caminho para que coisas dessa laia conquistem terreno. Além de indiferença no leitor, esse tipo de abordagem espanta entrevistado. Pense nisso!

Henrique Inglez de Souza

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