O FIM DE ANO DOS ESTRANHOS

"Feliz Natal e próspero Ano Novo a você e aos seus" – quem nunca ouviu ou recebeu essa mensagem? Mesmo que haja sutis diferenças, como "que o próximo ano seja de sucesso e realizações" ou coisas assim, no final do ralo, é tudo a mesma porcaria. Ano após ano e o ritual se repete! A única diferença está nos meios de propagação, que se pluralizam conforme as tecnologias avançam.
 
Houve um tempo em que eu ficava preocupado em responder e até a me antecipar a certos contatos para não ficar chato, deselegante. Bolava textos que fizessem a diferença, com teor de emoção e poesia. Queria porque queria ser o amigo que mais fundo tivesse atingido os corações. Dependendo da pessoa, escrever míseras quatro linhas levava uma eternidade, tamanha a minha intenção em ser especial.
 
Acho que nós somos assim mesmo, seja nos recados "carinhosos", seja nos presentes que damos. Queremos, de algum jeito, o destaque principal. Ser aquele ou aquela que acertou em cheio. É tão bom, não é mesmo? O ego e a mente agradecem. Por outro lado, é tão vazio... Ou melhor, é tão babaca. Para mim, essas "lembranças" são tão cheias de emoção quanto o gemido de uma puta no ápice de uma transa bem paga.
 
A questão é: você realmente sente aquilo que envia aos outros? Seja sincero! Vamos combinar: É claro que não! Sabe, não faço o menor gosto por coisas automáticas ou burocráticas. Não irei me chatear se não receber seus votos disso ou daquilo - não, desde que sejam o oposto do que é honesto e puramente caloroso. E também não espere algo de mim. Ainda sou a favor das coisas feitas pelo que conhecíamos como vontade de agradar. Todavia, o pior é que, ainda assim, esperam e me cobram esses cartões automáticos, enviados de uma só vez para a lista gigantesca de contatos que mantemos.
 
Com esses sites ditos de relacionamento, notei que ficou ainda mais fácil e bem oportuno o descompromisso. É um negócio de "feliz aniversário" gerado sem a nossa atenção ou um tal de copiar e colar citações extraídas de qualquer fonte, independentemente de a origem estar garantida. Portanto, qualquer um que escrever mensagens de para-choque e assinar como Machado de Assis ou Clarice Lispector ganha espaço. Por quê? Por causa dessa multidão de melodramáticos achando que compartilhar merdas assim resolve os problemas da vida. Na essência, são somente desencargos mentais.
 
E são eles os mesmos que nos enviam odiosas saudações de fim de ano. Gente que te evita ou não se mexe o mínimo para te encontrar pessoalmente e, de repente, quer que seu Natal seja alegre e seu próximo ano traga realizações. Qual é, hein? Prefiro que me xinguem. Soa mais adequado. Aliás, já me chamaram de rabugento por causa do que penso. Mas fazer o quê? No fundo, entendo que ninguém gosta mesmo de se refrescar no banho da verdade.
 
Conforme os anos passam, mais vejo a falta de sinceridade e a estafante obrigação em prol de se fazer a parte "que lhe cabe". Há quem retruque usando a delicadeza como boa desculpa. Entretanto, não é nada disso! É só o cumprimento do dever de encerramento do expediente no mês de dezembro. Agradeço, mas não faço a menor questão. Ainda sou de telefonar ou escrever algo pessoal a alguém específico ao invés da comodidade fria de me utilizar do pré-fabricado. Desejar algo real é como um carinho ou agradecimento terno, olho no olho, de dizer um "obrigado" com convicção.
 
Não será a internet que me privará do direito de usar o meu próprio cérebro e coração. Lembre-se: internet é só o nome chique para preguiça e falta de laço. Pense nisso várias vezes antes de me enviar porcaria eletrônica!
 
Henrique Inglez de Souza

Comentários